quinta-feira, 24 de setembro de 2015

ORGULHO

Desde o tempo de Adão e Eva que a culpa é sempre do outro. Eva comeu a maçã por culpa da serpente. Adão comeu por que Eva lhe ofereceu. Os cristãos culpam a mulher por todo pecado. E assim caminha a humanidade.
Talvez, ao ver sua imagem refletida nas águas, o homem tenha ficado tão encantado que perdeu a oportunidade de enxergar-se. Nem a evolução do espelho trouxe luz à consciência, simplesmente banalizou o culto a aparência.
Mantemos a aparência de “bons moços” enquanto a culpa é do próximo. Basta mudarmos de idéia, algo dar errado ou ser criticado para corremos como ratos sem rumo. Não importa os acordos ou as associações que tenhamos feito anteriormente. Desagradou, pula-se fora. Isso vale na política. Nas relações pessoais. Na sociedade em geral.
Um bom exemplo disso é referirmos uns aos outros como se fossemos de outro mundo. O brasileiro é corrupto. O governo brasileiro é ladrão. Religião é lavagem cerebral. O morador de rua é vagabundo. Pobre é “gente diferenciada”. Quem mora na favela é traficante. Adolescente não quer nada da vida. A saúde não tem jeito. Segurança não existe. Multa de trânsito é absurdo. Ciclovia é desnecessária. Faixa de ônibus incomoda muita gente. Enfim, brasileiro é isto ou aquilo e o resto que se exploda. Eu sou o tal, e você é de onde?
Se os outros países são tão bons por que têm tantos estrangeiros vivendo aqui? Seja por opção ou refugiados de guerra, eles trocam sua pátria pelo Brasil e passam a fazer questão de ser chamados e tratados como brasileiros.
Mesmo não tendo nenhum traço latino, sendo branco como a neve, ruivos, loiros, de olhos azuis, de olhos puxados. Não importa. Eles não se importam.
Outro dia visitei uma feira de artesanato que reuniu representantes de vários países. Parei na barraca de artigos da Turquia e enquanto esperava ser atendida ouvi do artesão que acabava de moldar sua peça: “Os brasileiros deveriam ter mais orgulho do Brasil, eu não troco este país por nenhum lugar do mundo.”
Como peguei o fim da história tratei de iniciar outra: “Você é de onde?”
- Sou de Florianópolis.
- Florianópolis é linda.
- O país todo é lindo. O povo é maravilhoso. Nasci na Turquia e vivo aqui há 10 anos, por isso já me considero brasileiro.
- Que bom!
- Corrupção, fome, desemprego, pobreza, doença, violência, tem em todo lugar. No Brasil não tem guerra, não tem terremoto nem furacão. Aqui se tem liberdade, Há paz entre os povos. Isso não se acha em lugar nenhum.
Ufa! Encontrei um compatriota. Fiquei emocionada e achei melhor ficar calada. Peguei meu quadro e me despedi daquele “brasileiro” orgulhoso que me envolveu num forte e inesperado abraço.
Segundo ele, aprendeu conosco a ser acolhedor, sem preconceitos e a demonstrar seu afeto com abraços.
Que as más línguas não saibam disso.